Taxa de cesáreas, após a exclusão de mulheres com alto risco de necessitarem de parto cirúrgico

Fonte:
World Health Organization (WHO) Regional Office for Europe – Projeto "Performance Assessment Tool for quality improvement in Hospitals" (PATH).
Definição:

Número de partos cesáreos, como porcentagem do número total de partos.

Nível de Informação:

Processo

Dimensão da Qualidade:

Efetividade clínica

Segurança do paciente

Eficiência

Governança

Cuidados centrados no paciente

Numerador:

Número total de partos no denominador com código de procedimento de parto cesáreo.

Denominador:

Número total de partos.

Exclusões:

Parto antes da 37ª semana de gestação, morte fetal, gestação múltipla, parto pélvico, apresentação anormal.

Racionalidade:

A cesárea é o procedimento cirúrgico mais comum em muitos países industrializados. Em 2002, na Europa, a taxa de cesáreas variou de 6,2 a 36%, com média de 19% (Betrán et al., 2007), e essas taxas têm crescido regularmente na maioria dos países da região europeia. Estes números estão bem acima das recomendações da OMS, segundo a qual as taxas não devem se manter acima de 10-15% (WHO, 1985). Embora ainda haja controvérsias sobre a taxa ideal de cesáreas, em muitos países desenvolvidos com taxas consideravelmente acima de 15% a atenção tem se voltado a estratégias para reduzir o uso, devido à preocupação de que taxas mais altas de cesárea não tragam benefícios adicionais de saúde e ainda possam aumentar os riscos maternos, gerar implicações para gestações futuras e acarretar custos aos serviços de saúde (Betrán et al., 2007). Este indicador pode ter um grande potencial de melhoria de qualidade em diversos tipos de situação.

O custo da coleta de dados é baixo. Este indicador se baseia em dados rapidamente disponíveis em bancos de dados administrativos (registros de alta) na maioria dos países, e já está sendo regularmente monitorado. Existe um alto consenso quanto a seu uso.

Programas de melhoria de qualidade baseados em dados apoiaram a redução na taxa de cesáreas (Kazandjian & Lied, 1998; Main, 1999). Dados do PATH, mostram que hospitais com taxas de cesáreas abaixo de 10% foram extremamente raros.

Alguns hospitais integrantes do PATH indicaram não ter sido capazes de identificar os critérios de exclusão do denominador, e alguns se basearam em outras fontes (documentos médicos hospitalares). A demanda por cesárea induzida pela mãe (parto cesáreo solicitado pela mãe — uma solicitação a termo na ausência de indicações médicas ou obstétricas) foi citada repetidamente, em muitos países, como o principal responsável pelas altas taxas de cesáreas, especialmente em primíparas. Esta observação confirma numerosos comentários na literatura médica, segundo os quais a demanda dos consumidores contribui consideravelmente para o crescimento persistente dos partos cesáreos a nível internacional (McCourt et al., 2007). Entretanto, uma revisão da literatura (2000-2005) ressalta que um número pequeno de mulheres solicita uma cesárea. As preferências das mulheres pelo parto cesáreo variaram entre 0,3 e 14%; só 3 estudos examinaram diretamente estas preferências sem indicação clínica (McCourt et al., 2007).

Dentre os critérios recomendados pelo Ministério da Saúde para referência e contra-referência na rede de serviços organizada para a atenção obstétrica e neonatal está o incentivo ao parto normal e à redução da cesárea desnecessária (BRASIL, 2006).

Ajuste de Risco:

Sem ajuste de risco.

O ajuste de risco para a taxa de partos cesáreos é dificultado por carências nas fontes de dados secundários disponíveis ou pela necessidade de extensas revisões de prontuários. Dessa forma, não é proposto com este objetivo. É preciso ter muito cuidado na interpretação dos resultados, pois foi demonstrado que o ajuste de risco pode ter um impacto considerável na classificação de hospitais (Aaron et al., 1998; Pasternak et al., 1999). Ao excluir alguns partos com alto risco de cesárea, o indicador, de certa forma, está reduzindo a variabilidade nas características das pacientes. Sugere-se comparar a porcentagem de partos excluídos do denominador dentre o número total de partos. Esta medida pode refletir diferenças no perfil das pacientes atendidas no hospital (case-mix) ou diferenças no modo como os critérios de exclusão são identificados e codificados nos registros de alta ou em fontes alternativas. Portanto, é aconselhável comparar esta medida nos diferentes níveis de atendimento (p.ex., hospital universitário com centro intensivo neonatal × hospital local). Posteriormente, o grupo de hospitais participantes deve discutir se as diferenças efetivamente representam diferenças nos perfis das pacientes atendidas em cada hospital (partos complexos orientados a níveis mais altos de atendimento).

Estratificação:

Sugere-se a estratificação em subgrupos para gerar referenciais de excelência para as taxas de cesáreas entre as distintas unidades e para auditar os resultados da taxa total de cesáreas (Classificação de Robson) (Robson, 2001; McCarthy et al., 2007).

Classificação de Robson:

(1) mulheres nulíparas com gestação única cefálica, com 37 semanas de gestação ou mais, em trabalho de parto espontâneo;

(2) mulheres nulíparas com gestação única cefálica, com 37 semanas de gestação ou mais, que tiveram parto induzido ou foram para cesariana antes do parto;

(3) mulheres multíparas, sem cicatriz uterina anterior, com gestação única cefálica, com 37 semanas de gestação ou mais, em trabalho de parto espontâneo;

(4) mulheres multíparas, sem cicatriz uterina anterior, com gestação única cefálica, com 37 semanas de gestação ou mais, que tiveram parto induzido ou foram por cesariana;

(5) Todas as mulheres multíparas, com pelo menos uma cicatriz uterina anterior e gestação única cefálica, com 37 semanas de gestação ou mais;

(6) todas as mulheres nulíparas com gestação única pélvica;

(7) todas as mulheres multíparas com gestação única pélvica, incluindo, as mulheres com cicatriz uterina anterior;

(8) todas as mulheres com gestações múltiplas, incluindo mulheres com cicatriz uterina anterior;

(9) todas as mulheres com gestação única, com uma posição transversal ou oblíqua, incluindo mulheres com cicatriz uterina anterior;

(10) todas as mulheres com gestação única cefálica, com 36 semanas de gestação ou menos, incluindo mulheres com cicatrizes prévias.

Interpretação:

O indicador é difícil de interpretar devido aos diversos motivos que aumentam a taxa de cesáreas (fatores clínicos, mas também culturais e socioeconômicos) e devido ao baixo consenso sobre a taxa ideal de cesáreas. Este indicador é bidimensional. Isto significa que tanto as taxas altas quanto as baixas devem ser examinadas. Espera-se um viés de seleção (gestações de alto risco concentradas em algumas instituições, escolha, pela mãe, de médico que se encaixe em sua preferência em termos de parto cesáreo ou vaginal).

Portanto, o melhor ponto de referência é a própria instituição: É fundamental examinar a evolução ao longo do tempo e entender que fatores podem afetar as tendências.

A comparação entre hospitais dentro de um mesmo país pode ser relevante para identificar algumas das melhores práticas e para entender por que a taxa de cesáreas é estável em algum hospital enquanto a tendência geral é um aumento (acentuado) na taxa. As comparações internacionais têm menos valor devido aos múltiplos fatores externos (culturais, socioeconômicos) que podem afetar o resultado; além disso, certas influências são muito difíceis de isolar ou de tornar explícitas.

Diversos fatores organizacionais, como o tipo de equipe de plantão, o nível dos serviços pediátricos e a arquitetura das maternidades, exercem um forte impacto e têm um efeito considerável na taxa de cesáreas (Naiditch et al., 1997). Diversas estratégias demonstraram um impacto na redução de taxas de cesáreas, como auditorias e retroalimentação, melhorias de qualidade e estratégias multifacetadas, enquanto as melhorias de qualidade baseadas numa conduta ativa do parto apresentaram um efeito misto, numa meta-análise (Chaillet & Dumont, 2007). Além disso, foi demonstrado que a identificação prospectiva de estratégias eficazes e de barreiras à mudança é necessária para adaptar as intervenções e melhorar a implementação de diretrizes clínicas (Chaillet et al., 2007). Numa perspectiva de orientação da paciente, ao se comparar a taxa de cesáreas, sugere-se também comparar o conteúdo e a qualidade das informações fornecidas às mães grávidas sobre os riscos e benefícios do parto cesáreo. Uma comparação entre o conteúdo dos formulários de consentimento informado é relevante (veja, por exemplo, UK Royal College of Obstetricians and Gynaecologists, draft informed consent for c-section — http://www.rcog.org.uk/womens-health/consultation-documents). O temor por si mesma e pelo bebê parecem ser os principais fatores por trás do pedido de uma mãe pela cesárea, associado à crença de que o parto cesáreo é mais seguro para o bebê (Chaillet et al., 2007). Portanto, o aconselhamento materno é fundamental para reconhecer as preferências das mulheres enquanto se oferece o atendimento mais adequado.

Medidas complementares para um exame mais apurado — investigar os casos atípicos (pontos fora da curva) - Principais medidas específicas/dados para investigar as causas dos casos atípicos:

- Análise de subgrupos (Robson, 2001);

- Proporção por categoria de urgência (ameaça imediata à vida da mãe ou do feto);

- Risco materno ou fetal sem risco de vida imediato;

- A mãe pode precisar de um parto breve, mas não há risco materno ou fetal (horário do parto marcado para se adequar à mãe e à equipe) (classificação segundo o National Confidential Enquiry into Perioperative Deaths, NCEPOD);

- Distribuição temporal das cesáreas (p.ex., dia da semana/fim de semana);

- Taxas específicas do cirurgião/obstetra;

- Taxa de uso de anestesia epidural;

- Proporção de partos vaginais mal-sucedidos após a cesárea;

- Indução do parto;

- Presença de diretrizes sobre indicações de cesárea na unidade;

- Presença de material de apoio às mulheres com escolhas informadas.

As práticas de codificação devem ser discutidas entre os hospitais participantes, para avaliar em que medida os critérios de exclusão são especificados nos registros de alta ou se é preciso obter fontes alternativas de informação em alguns casos.

Fonte de Dados:

Banco de dados administrativos hospitalares

Bibliografia:

1. Veillard J, Champagne F, Klazinga N, et al. A performance assessment framework for hospitals: the WHO regional office for Europe PATH project. Int J Qual Health Care. 2005 Dec;17(6):487-96. Epub 2005 Sep 9.

2. WHO Regional Office for Europe. Performance Assessment Tool for Quality Improvement in Hospitals. Indicators descriptions sheets 09/10. December 2009.

3. Betrán AP, Merialdi M, Lauer JA, Bing-Shun W, Thomas J, Van Look P, Wagner M. Rates of caesarean section: analysis of global, regional and national estimates. Paediatric and Perinatal Epidemiology, 2007;21: 98-113.

4. World Health Organization. Appropriate technology for birth. Lancet 1985; 2:436-437.

5. Kazandjian VA, Lied TR. Cesarean section rates: effects of participation in a performance measurement project. Joint commission Journal on Quality Improvement 1998;24(4):187-196.

6. Main EK. Reducing cesarean birth rates with data driven quality improvement activities. Pediatrics 1999; 103 (1supp.E):374-383.

7. McCourt C, Weaver J, Statham H, Beake S, Gamble J, Creedy DK. Elective cesarean section and decision-making: a critical review of the literature. Birth 2007;34 (3):273-274.

8. Aaron DC, Harper DL, Shepardson LB, Rosenthal GE. Impact of risk-adjusting cesarean delivery rates when reporting hospital performance. Journal of the American Medical Association 1998;279:1968-1972.

9. Pasternak DP, Pine M, Nolan K, French R. Risk-adjusted measurement of primary cesarean sections: reliable assessment of the quality of obstetrical services. Quality Management in Health Care 1999;8(1):47-54. 1999.

10. Robson MS. Classification of caesarean sections. Fetal and Maternal Medicine Review 2001; 12(1) 23-39).

11. McCarthy FP, Rigg L, Cady L, Cullinane F. A new way of looking at caesarean section births. Australian and New Zealand Journal of Obstetrics and Gynaecology 2007;47:316-320.

12. Naiditch M, Levy G, Chale JJ, Cohen H, Colladon B, Maria B, Nisand I, Papiernik E, Souteyrand P. Cesearean sections in France: impact of organizational factors on different utilization rates (French). Journal de Gynécologie, Obstétrique et Biologie de la Reproduction 1997;26(5):484-495.

13. Chaillet N, Dumont A. Evidence-based strategies for reducing caesarean section rates: a meta-analysis. Birth 2007;34(1):53-64.

14. Chaillet N, Dubé E, Dugas M, Audibert F, Tourigny C, Fraser WD, Dumont A. Evidence-based strategies for implementing guidelines in obstetrics: a systematic review. Birth 2007;34(1):65-79.

15. https://www.rcog.org.uk/en/guidelines-research-services/guidelines/consent-advice-7/

16.BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Ações Programáticas Estratégicas. Área Técnica de Saúde da Mulher.  Pré-natal e Puerpério: atenção qualificada e humanizada – manual técnico/Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Ações Programáticas Estratégicas. - Brasília: Ministério da Saúde, 2006. 163 p. color. – (Série A. Normas e Manuais Técnicos) – (Série Direitos Sexuais e Direitos Reprodutivos – Caderno nº 5).

17.BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Ações Programáticas Estratégicas. Gestação de alto risco: manual técnico / Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Ações Programáticas Estratégicas. – 5. ed. – Brasília : Editora do Ministério da Saúde, 2012. 302 p. – (Série A. Normas e Manuais Técnicos).

Ano da Publicação:
2014