Práticas hospitalares seguras reduzem risco de eventos adversos

Autor pessoal: 
GIACOMINI, PAULO;

“Foram gastos milhões para recuperar as caixas-pretas do avião que caiu perto de Fernando de Noronha. Esses recursos não foram utilizados para culpabilizar o piloto ou o fabricante da aeronave, mas para que se aprenda com o incidente”, afirma a professora de Enfermagem Maria de Jesus C. S. Harada, referindo-se ao voo 447 da Air France, que caiu no Oceano Atlântico em 2009. As caixas-pretas foram resgatadas em maio último.

Com a referência, Harada estabelece uma analogia entre as ocorrências que provocaram a queda do Airbus e a ampla difusão dos eventos adversos que levaram a óbito um neonatal em 6 de novembro deste ano e uma adolescente de 12 anos em 9 de dezembro de 2010, ambas em São Paulo.

Doutora em enfermagem pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), Maria de Jesus Harada coordenou o projeto Enfermagem para Segurança do Paciente, desenvolvido pela gestão 2008–2011 do Conselho Regional de Enfermagem do Estado de São Paulo (Coren-SP), em parceria com a Rede Brasileira de Enfermagem e Segurança do Paciente (Rebraensp).

Por meio de sua assessoria de imprensa, a Secretaria Municipal da Saúde de São Paulo (SMS-SP) esclareceu que a rede hospitalar municipal segue protocolos para garantir a segurança do paciente. “Comitês de qualidade e de risco hospitalar realizam o treinamento dos profissionais que trabalham nas unidades, tudo de acordo com a característica de cada uma delas, buscando a melhoria contínua da qualidade dos serviços prestados aos usuários dos hospitais do município.”

Segundo a secretaria, a rede hospitalar da Autarquia Municipal Hospitalar (AHM) desenvolve projeto de capacitação profissional em parceria firmada em convênio com o Hospital Samaritano. O projeto, que inclui em seu escopo os seis itens de protocolos de segurança propostos pela Organização Mundial de Saúde (OMS), vem reciclando funcionários desde maio e até o fim do ano deve capacitar seis mil profissionais e o mesmo contingente em 2012. “Essa capacitação deverá atingir 60% da categoria Enfermagem e 30% da Médica. Os outros 10% serão voltados para os demais profissionais que atuam na rede hospitalar do município de São Paulo.”

O Hospital Samaritano é um dos seis hospitais de excelência reconhecidos pelo Ministério da Saúde e um dos 19 acreditados por três vezes no Brasil pela Joint Commission International (JCI), referência mundial em prestação de serviços de acreditação e certificação para melhorar a segurança do atendimento ao paciente.

Na estrutura organizacional do Hospital Samaritano de São Paulo, a Coordenação da Qualidade é a área responsável por zelar para que todos os procedimentos relativos à instituição estejam alinhados aos padrões de qualidade da JCI, organização mundial que se dedica a avaliar a qualidade nas instituições de saúde.

A área é responsável pelo suporte na elaboração de documentos e coordena as avaliações internas que visam a verificação da adequação aos padrões referenciais de qualidade da JCI aos protocolos, políticas e normas estabelecidas. A Coordenação de Qualidade, chefiada pela infectologista Maria Lúcia Neves Biancalana também monitora os indicadores de qualidade institucionais, atua na capacitação de colaboradores e promove ações voltadas para o corpo clínico.

“Um dos destaques nessa área é a adoção das Metas Internacionais de Segurança, ou seja, as medidas que devem ser tomadas para tornar a prática do cuidado ao paciente mais segura. Elas destacam as áreas e as atividades mais críticas na assistência à saúde e apresentam soluções simples para essas questões, baseadas em evidências e na opinião de especialistas e entidades médicas. Mais do que conhecer as metas, o importante é aplicá-las no dia a dia e incorporar o seu uso”, afirma Biancalana.

Mas, para Harada é necessário um maior aprofundamento dos fatores que possam induzir o profissional de enfermagem a descuidar-se da segurança do paciente, entre os quais está a carga horária da formação e do estágio. Outros desencadeantes podem ser a estrutura física do local de trabalho, o estresse, o sono e a carga horária, além da quantidade de pacientes sob a responsabilidade dos cuidados do profissional da Saúde.

Dentre os eventos adversos mais comuns encontram-se fundamentalmente o preparo e a administração de medicamentos. “Atualmente, um medicamento aprovado hoje pode chegar em até uma semana ou menos ao serviço”, afirma Harada. “Mas não há um treinamento aprofundado para que esta medicação seja utilizada. Os processos de administração de medicamentos na área da Saúde deveriam ser desenhados para obedecer a um procedimento cognitivo, devem ser administrados corretamente a partir da primeira posologia”, ensina a professora, sobre o ramo da ciência médica que estuda a dose adequada de determinado medicamento para cada caso.

Atualmente, há cerca de 1,5 milhão de profissionais de enfermagem no Brasil, dos quais apenas 360 mil são enfermeiros graduados. Os 1,14 milhão restantes são auxiliares e técnicos, e estão nas linhas de cuidado. Harada também questiona a vocação desses profissionais, que “escolhem a profissão por uma questão de mercado”. Segundo ela, com um ou dois anos de formação é possível atuar em pelo menos dois empregos com um bom salário.

Metas internacionais de segurança propostas pela OMS adotadas pelo Hospital Samaritano e pela SMS-SP:

1 – Identificar os pacientes corretamente: adotar dois indicadores e identificar nome completo e data de nascimento;

2 – Promover a comunicação adequada: confirmação de ordem verbal ou telefônica;

3 – Melhorar a segurança de medicamentos de alto risco: armazenamento em local específico;

4 – Assegurar cirurgias com local de intervenção correto, procedimento correto e paciente correto: marcação de sítio cirúrgico e confirmação (time-out);

5 – Reduzir o índice de infecções associadas aos cuidados de saúde: higienização das mãos!

6 – Reduzir o risco de lesões ao paciente decorrentes de quedas: avaliação do risco e medidas de prevenção.

Por Paulo Giacomini, de São Paulo.